domingo, maio 13

Mãe


Mãe! Passa a tua mão pela minha cabeça!

Eu ainda não fiz viagens e a minha cabeça não se lembra senão de viagens! Eu vou viajar. Tenho sede! Eu prometo saber viajar!

Quando voltar, é para subir os degraus da tua casa, um por um. Eu vou aprender de cor os degraus da nossa casa. Depois venho sentar-me a teu lado. Tu a coseres e eu a contar-te as minhas viagens, aquelas que eu viajei tão parecidas com as que não viajei, escritas ambas com as mesmas palavras.

Mãe! Ata as tuas mãos às minhas e dá um nó cego muito apertado! Eu quero ser qualquer coisa da nossa casa. Como a mesa. Eu também quero ter um feitio que sirva exa
tamente para a nossa casa, como a mesa.

Mãe! Passa a tua mão pela minha cabeça!

Quando passas a tua mão na minha cabeça, é tudo tão verdade!

Almada Negreiros, "A Invenção do Dia Claro"

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