quinta-feira, dezembro 7

O brasileiro lê muito

Arriba, arriba, arriba de una gran montaña de libros (ilustración de Lisa Aisato)
Lisa Aisato
O brasileiro não lê pouco, pode ler mal ou não comprar livros como se gostaria, mas a média de leitura nacional é muito boa, do contrário, não seríamos uma das nações que mais frequenta redes sociais no mundo, onde se usa o texto como a principal forma de comunicação, e nem teríamos tiragens de best-sellers na casa dos milhares quando não milhões.

Mas vou mais e lembro-me dos cinco bilhões de reais que representam o mercado brasileiro no cenário mundial, sendo, portanto, um dos maiores mercados do setor editorial em faturamento. Número que já oscilou na casa dos seis bilhões quando o poder público, em especial o federal, mantinha vivo seus fundamentais programas de compras.

A reflexão necessária é de que há uma espécie de preconceito aberto e declarado, como se chamar o povo de burro fosse regra, ou que as pessoas não compram livros nem leem aquilo que certa elite gostaria porque são ignorantes. Também há a hipótese de que a desinformação sobre o mercado do livro e os índices de leitura seja gigantesca, e que mesmo bons jornalistas e profissionais da comunicação têm dificuldade em encontrar dados que derrubem esse conceito, ou preconceito, sobre os índices de leitura.

Não podemos, porém, deixar de observar que para o tamanho do país e da população, se comparados a vizinhos como Argentina, nossa leitura per capta é de fato tímida. E que a leitura poderia ser melhor, visto, por exemplo, a ausência de leitores com seus livros abertos em lugares públicos como em metrôs e ônibus. Mas, para isso, é bom não esquecer que nas universidades muito ainda se usa, infelizmente, as tais cópias “xerox”, como substituição ao livro, e que essas cópias não entram nos números, tampouco cálculos estatísticos, ou sequer passam nos olhos ávidos de quem procura um leitor de livro aberto numa estação de metrô.

Em verdade, e aqui uma opinião mais do que honesta, é de que embora leiamos muito, a realidade é de que lemos mal, e muito mal. O fato de encontrarmos livros infantojuvenis adotados em escolas com erros de pontuação e histórias frouxas, ruins, é um comprovador. Também é comum encontrar autor que se autopublica dizendo vender bem a cada nova tiragem ou novo título, e depois descobrirmos que seus leitores – e eles existem como se comprova na gráfica ou nas vendas pelo KDP da Amazon –, não percebem como fracas são suas histórias e como confusos são seus pensamentos ou mesmo a organização do seu texto.

Há, também, nesse deserto do texto ruim, livros impressos fora do país, mas vendidos a preços impressionantemente baixos, livros estes muitas vezes com histórias sofríveis e ilustrações deprimentes. E ainda há os títulos traduzidos às pressas ou por maus tradutores – e aqui entra a literatura adulta de qualquer área – como outro sinal da má qualidade do que chega ao leitor, que, por sua vez toma aquilo como uma média do que pode ser escrito e do que deve ser lido. Em outras palavras, o referencial do que é bom em escrita e leitura, no Brasil, é um desespero de tão ruim.

Em outros artigos defendi e sigo defendendo a importância da escrita criativa e suas oficinas, pois, como referência, nos EUA pós-guerra, esse foi um dos instrumentos para não só movimentar o mercado norte-americano como por outro lado reforçar a educação fora das escolas.

Enquanto isso, neste Brasil continental de história tão amiga a elites que preferem a escravidão à liberdade, talvez não devesse soar estranho afirmar que o povo brasileiro simplesmente não lê porque é ignorante. Mas não sou da elite, sou do povo, do estudante da escola pública, e dos otimistas, pois gosto de pensar que apesar das elites e de nossa história de golpes e massacres, o povo ainda lê, e ainda quer ler mais e melhor. E, quem sabe, talvez aí esteja a tarefa dos editores, autores e agentes do mercado: superar o preconceito e fazer mais e melhor pelo leitor brasileiro.

Paulo Tedesco

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