sexta-feira, maio 29

'Inviável', Livraria Leonardo da Vinci anuncia fechamento

Milena Duchiade
Depois de 63 anos de serviços literários prestados ao Rio de Janeiro, a Livraria Leonardo da Vinci perdeu a batalha para os novos tempos e vai fechar as portas ainda em 2015. A loja, fundada pelo romeno Andrei Duchiade, realizará uma queima de estoque a partir de 1º de junho. Milena Duchiade, herdeira do negócio, afirma que é impossível continuar operando com prejuízo. Numa tentativa de diminuir as perdas, a casa já começou a desocupar as quatro salas do histórico Edifício Marquês de Herval, na Avenida Rio Branco. Até o mês que vem, serão apenas duas, abertas até o fim da liquidação.
Nós estamos sendo punidos por nossas qualidades. Nossas virtudes tornaram-se defeitos. Não temos um café, não vendemos papelaria, nem informática. Vendemos pouca autoajuda e poucos best-sellers. Temos um nicho, muito específico, que está sob pressão
Desde 1952, a livraria é reduto de intelectuais e universitários que buscam obras importadas. Em tempos anteriores à internet, era responsável por suprir os leitores com os últimos lançamentos editoriais da Europa e dos EUA. Aos poucos, foi adicionando títulos nacionais às prateleiras. Carlos Drummond de Andrade homenageou a loja, que fica no subsolo do prédio, com versos. Na época da morte de Andrei, em 1965, quem assumiu o comando foi sua mulher, Giovanna Piraccini. Em 1996, Milena se juntou à mãe na gerência dos negócios.

Nas estantes da Leonardo da Vinci ainda repousam livros cujo preço original era cotado em pesetas espanholas e francos, da França, por exemplo. As obras, que fazem parte de um estoque estimado em mais de cem mil exemplares, foram compradas antes do surgimento do euro, em 2002, e esperam até hoje para serem vendidas. O modelo de negócios, baseado em fidelização da clientela, títulos especializados e, por conta disso, em um ritmo lento de vendas, esgotou-se de vez com o protagonismo de lojas virtuais e megalivrarias, diz Milena. Nem a incursão na Estante Virtual, site que reúne sebos e livrarias, foi capaz de reduzir as perdas. Milena afirma que as obras no Centro da cidade, nos últimos anos, aceleraram o processo:

— Foi a pá de cal que faltava. Nos dias seguintes às manifestações de 2013, as calçadas ficavam cheias de cacos das vidraças dos bancos. Quem anda na rua assim? Com a Rio Branco cheia de estilhaços e tapumes? No fim de 2014, em novembro, começaram as obras que destruíram a avenida. As pessoas não conseguem circular mais por aqui.

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A Livraria


Adentro os umbrais do Edifício Marquês do Herval,
o rito de passagem conduz às dimensões lúdicas.
Desço a espiral de um subterrâneo de luzes,
giram percepções de cristal:
o olhar desvenda iluminuras,
códices de preciosa indústria.
Anticaverna do tempo, flui o rio da memória,
núcleo de referência do mundo.
Nem toda livraria é um pórtico da galáxia, insígnia da vida.
Mas se Leonardo é o patrono,
um gênio conversa com o espírito dos livros
e o acervo suscita viagens insólitas.
Nem toda livraria exalta inexorável fortuna.
Mas se a vitrine é aquarela mística, ignição do estro,
motor geracional da história,
saio pela galeria conduzindo um artefato de plástico,
repleto da prosódia universal.
Se o patrono é Leonardo,
a livraria é ponto cardeal de insônia e êxtase.
Arcádia! Ágora! Acrópole!
No frontispício está escrito:
“Livraria Leonardo Da Vinci.”
Márcio Catunda

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