quarta-feira, abril 30

O homem e o livro

“Não existe nada mais parecido com um homem do que um livro. Com um homem ou com uma mulher. Porque os livros têm sexo. Encontrei livros masculinos, livros femininos, livros neutros. Bem ou mal encadernados, entes e livros carregam destino igual. Só que as nossas traças e os nossos cupins exageram a rapidez. Há livros felizes. Há livros infelizes. Todo livro é um milagre. Mesmo o livro que não presta. Começou dando prazer a quem o realizou, prazer de ilusão, o melhor; e a quem o lê, dá a ventura de se julgar superior, ventura que não é séria, mas é tão agradável! O livro é o milhão dos pobres. É a certeza dos impossíveis desesperados. É o Pedro Álvares Cabral das terras desconhecidas, descobertas por acaso. É o mundo debaixo dos nossos olhos. Pelo livro podemos viajar em torno de um quarto e ir até aos planetas suspeitos de rivalidade. Vemos obras-primas de museus e exposições, sentados em casa. Vamos à guerra de pijama. Assistimos em Nova Iorque e em Tóquio, a comédias dolorosas, a dramas engraçados, a óperas adormecentes. Olhamos bailados. Ouvimos canções. Pelo livro entramos nos circos universais e os palhaços fazem cabriolas, saltam, gritam coisas diante de nós, que nunca tínhamos rido tanto... Abençoados os que fazem livros! São eles que inventam a vida. São eles que mudam os figurinos da vida”.
Texto "Abençoados", no livro "O dia nos Olhos", de Álvaro Maria da Soledade Pinto da Fonseca Velhinho Rodrigues Moreira da Silva (1888/1964), conhecido por Álvaro Moreyra, escritor, poeta e teatrólogo 

Nenhum comentário:

Postar um comentário